Figuras do Chiado

Helena Vaz da Silva

O Chiado é um lugar de livros, de livrarias, de escritores, de tertúlias, de revistas. Helena Vaz da Silva (1939-2002) criou condições para que isso se tornasse cada vez mais realidade. O prazer da leitura foi-lhe incutido pelo pai, a que associou naturalmente uma extraordinária curiosidade e um entusiasmo pela vida, que a vai lançar com apenas 17 anos numa vida profissional inesperada, na agência de publicidade Martins da Hora, na mesma banca onde tinha trabalhado Fernando Pessoa.

Helena Vaz da Silva afirmou que os seus escritos eram como “pequenas pedras” que ia semeando. Foi, assim, sempre semeando pequenas pedras. “Pedras como as do Polegarzinho – do conto da nossa infância – que se deitam para ajudar a reconhecer o caminho; pedras como a que se lança quando se começa a fazer uma casa; pedras brancas e de cor para dar brilho ao nosso dia a dia ou para lhe acentuar os contornos”. Helena começou por ser marcada pela família, em especial exatamente por seu Pai, Francisco de Mascarenhas Gentil, brilhante advogado, que morreria precocemente quando ela tinha apenas 9 anos. A personalidade forte do homem de leis e de cultura, filho do célebre médico Francisco Gentil, fundador do Instituto Português de Oncologia, marcá‑la-ia profundamente. Pode dizer-se que as conversas do pai incentivaram uma especial precocidade no conhecimento da História e do pensamento clássico, fundamento de uma visão aberta e de uma atenção desperta. Aprendeu a ler com a mãe nas páginas dos jornais.

O algo inesperado encontro com Alberto Vaz da Silva, com quem casa em 1959, abre-lhe as portas do influente grupo cultural dos católicos inconformistas da Livraria Moraes e do Círculo do Humanismo Cristão, em torno de António Alçada Baptista, com João Bénard da Costa, Pedro Tamen, Nuno Bragança, José Escada, Luís Sousa Costa, Nuno Cardoso Peres e Cristovam Pavia. Em 1978, assume a direção e a propriedade da revista “Raiz e Utopia”, fundada um ano antes por António José Saraiva, Carlos Medeiros e José Baptista, e imprime uma orientação virada para os grandes debates europeus do momento, bem simbolizada na secção “Abriu em Portugal”. “Lembro-me de uma frase de Malraux: ‘A liberdade, não sei o que é, mas sei o que é a libertação’. Existe sempre uma libertação a fazer em todos os minutos. Como a libertação nunca acaba, a Utopia provavelmente nunca chegará, quer dizer, nunca há o momento em que se diz ‘aqui está a Utopia’. Mas a Utopia começa no momento em que a pessoa inicia esse processo de libertação que nunca para”. A dimensão pessoal obriga a rever métodos e objetivos – antecipa-se a necessidade de compreensão dos limites, de entendimento da ligação entre ecologia e economia, de consideração da sociedade de rede, de articulação entre a raiz (“a crítica”) e a utopia (“o futuro”). Daí a tónica na ideia de “libertação”, como método da descoberta permanente, como ligação entre o real, a crítica e o futuro. Essa atitude de abrir novas pistas, ligava-se também ao restabelecimento de uma relação saudável com Portugal. Nuno Bragança di-lo, aliás, em diálogo com HVS: “A relação dos portugueses com Portugal é muito estranha. Estão todos de acordo em dizer mal de Portugal – e isto é uma constante que já vem de há muitos anos -, todos recusam um Portugal que obviamente existe porque eles são como são. As pessoas em Portugal têm a tendência para culpar os outros de defeitos que elas próprias também têm”. E, como Nuno Bragança ainda referia nesse diálogo sobre “Direta”: “O passado de uma nação é como o passado de uma pessoa; quanto mais remoto ele é, mais importante pode ser. Só quando uma pessoa – ou uma nação – se conhece a si própria, se pode assumir, e então escolher”. Interessará, por isso, nessa relação entre passado, presente e futuro, “encontrar o passado que está presente no presente”.

Em 1979, HVS é eleita Presidente da Direção do Centro Nacional de Cultura (CNC), num momento em que não poderia continuar o que caracterizara a associação no tempo da ditadura (em que não havia muitos espaços de debate). Inicia e desenvolve uma ação em prol da divulgação, do estudo e da preservação da língua e da cultura portuguesas, lançando os “Passeios de Domingo”, debates, colóquios, cursos livres, uma base de dados sobre o património, diversas publicações e o ciclo “Os Portugueses ao Encontro da Sua História”. Como disse Maria Calado: “ao lançar os passeios de Domingo introduziu-se em Portugal a prática dos itinerários culturais como forma de conhecimento e valorização do património histórico e da criação artística e cultural contemporânea”. Em 1992, está no Conselho de Orientação para os Itinerários Culturais do Conselho da Europa e, em 1994, foi eleita deputada ao Parlamento Europeu pelo PSD, exercendo um mandato marcante: “consegui pôr Portugal na agenda dos agentes culturais europeus e pôr a cultura na agenda da Europa”. Identidade de várias identidades e de várias culturas, a Europa deverá ainda ser um espaço de diversas línguas e do multilinguismo. “Se, como é inquestionável, uma cultura nacional – ou regional – se exprime pela língua, é indispensável assegurar que as línguas serão protegidas e estimuladas através do ensino escolar desde o nível básico, da tradução, da edição, da legendagem, da dobragem, da produção audiovisual e multimédia”. No entanto, para que a diversidade cultural seja preservada, é indispensável que o respeito pelas várias línguas seja garantido plenamente, sob pena de se criarem focos de tensão cultural e política inevitáveis. Não se defende a Língua defendendo, por princípio, indiscriminadamente todas as línguas. Defende-se a Língua procurando definir medidas para cada situação e implementando-as com decisão, antes que seja tarde”.

A palavra “mobilizar” entusiasmava Helena, por exigência, se o seu método preferido era descobrir, o instrumento por excelência era o de reunir vontades para realizar objetivos e desígnios. Falava, por isso, no ideal de fazer o novo século como o século da Educação. E dizia: “se queremos salvar-nos, assim terá de ser. Mas, para isso, urge uma mobilização geral e em força – que não está à vista”. E o que fazer: “Mobilizar os jovens, mobilizar os professores, mobilizar as coletividades e as empresas em torno de um objetivo comum: afirmar os portugueses como o principal recurso de Portugal”.

Guilherme d’Oliveira Martins

Jaime Batalha Reis

Padre Abel Varzim

Teixeira de Pascoaes

Francisco Sousa Tavares

Bulhão Pato

Nuno Álvares Pereira

José-Augusto França

Santa-Rita Pintor

Fernando Amado

Vasco Santana

Eça de Queiroz

Ramalho Ortigão

Fernando Pessoa

Sophia de Mello Breyner Andresen

Antero de Quental

Almeida Garrett

Aquilino Ribeiro

Almada Negreiros

Padre António Vieira

Vitorino Nemésio

Alexandre Herculano

António Quadros

Columbano Bordalo Pinheiro

Afonso Lopes Vieira

Giuseppe Verdi

António Alçada Baptista

Cesário Verde

Alexandre O´Neill e Amália

Gualdino Gomes

Amadeo de Souza-Cardoso